Montámos um laboratório de Planárias!
Esta página relata e partilha algumas imagens do dia das "Planárias na estrada", em que obtivemos e aprendemos a cuidar dos nossos primeiros espécimes de Girardia tigrina e demos início ao processo de estabelecer um laboratório de planárias no CBR.
Planárias para quê?
O Programa Lit Up foi desafiado por uma professora da Escola Secundária Quinta do Marquês, em Oeiras, no sentido de apoiar um projeto de investigação que teimava em não "descolar". A professora de Biologia Maria dos Anjos Tomaz e uma sua aluna do 12º ano, a Laura, queriam estabelecer na sua escola uma cultura de planárias de água doce para que a Laura pudesse levar a cabo um projeto sobre alterações climáticas.
A Laura está muito interessada em estudar que efeitos poderão ter duas consequências das alterações climáticas - o aumento da poluição (em virtude da atividade humana) e o aumento da salinidade (em virtude da subida do nível médio das águas do mar) - nos seres vivos que compõem os nossos ecossistemas, e gostaria de utilizar as planárias como organismos indicadores. As planárias são animais invertebrados, com simetria bilateral, do filo dos platelmintas, isto é, são vermes achatados, cujo corpo tem o aspeto de fita. Devido à sua considerável sensibilidade a poluentes, são frequentemente utilizadas como bioindicadores da qualidade das águas.
Pareceu-me uma pergunta muito pertinente, pelo que contactei o Dr. João Pestana, um investigador que trabalha com planárias no Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) da Universidade de Aveiro, para saber se esta ideia tinha pernas para andar, ou melhor, para planar :) O Dr. João Pestana mostrou-se logo disponível para coloborar e tornar o projeto da Laura uma realidade. Explicou-nos que, entre outros organismos, trabalha em estudos de ecotoxicologia com uma espécie de planária chamada Girardia tigrina ou Dugesia tigrina, também chamada de planária castanha. A Girardia tigrina é um dugesídeo, uma família de planárias de água doce e de vida livre, cujos adultos têm um comprimento de 6 a 15 mm. Têm uma cabeça triangular, com 2 olhos/ocelos, e 2 aurículas laterais, quimiorreceptores que se projetam da zona lateral da cabeça ou zona anterior do animal e detectam substâncias químicas no ambiente circundante, além de serem sensíveis ao toque e a correntes na água. São predadoras ou necrófagas, e movem-se através de cílios na sua superfície ventral.
Figura 1. Visita ao laboratório de ecotoxicologia do Dr. João Pestana na Universidade de Aveiro, onde adquirimos o "know-how" para manipular planárias. Pudemos admirar os aquários com cápsulas ou casulos (dentro dos quais estão os ovos de planária), juvenis e adultos da espécie de planária Girardia tigrina ou Dugesia tigrina ou simplesmente planária castanha, que é fácil de propagar em laboratório. Os adultos de Girardia tigrina apresentam uma cor cinza a castanha, com pigmentação mais escura - semelhante às listras de um tigre (daí o nome tigrina). O Dr. Pestana ensinou a Laura e a professora Tomaz a cuidar das culturas de planária no laboratório, a identificar as características morfológicas destes animais invertebrados fascinantes debaixo de uma lupa ou microscópio estereoscópico, e a fazer ensaios de locomoção e de regeneração, que serão necessários para a execução do projeto sobre as alterações climáticas (ou outros projetos futuros).
Em várias conversas à distância falamos de composição do meio e de condições de cultura, de ensaios e de controlos, mas faltava-nos o mais importante: as planárias, que estavam em Aveiro e nós queríamos ter na escola em Oeiras...
Planárias na estrada!
Foi aí que o Gabinete de Ciência e Inovação da Câmara Municipal de Oeiras (CMO) entrou em ação, e nos proporcionou uma viatura e um motorista para fazer connosco os cerca de 270 km que separam a escola Quinta do Marquês e o campus da Universidade de Aveiro, para podermos ir aprender tudo o que alguma vez quisemos saber acerca de planárias com o Dr. Pestana!
Numa bela manhã de março, com o Sr Milton (motorista da CMO) ao volante, fizemo-nos à estrada. Chegadas a Aveiro, o Dr. Pestana mostrou-nos e explicou-nos tudo o que é preciso para montarmos o nosso próprio laboratório de planárias em Oeiras: a metodologia necessária para manter as planárias em cultura, para produzir o seu meio, e para realizar as várias experiências do trabalho da Laura. A Laura pôde até fazer os seus primeiros ensaios de locomoção e de regeneração! Ainda pudemos ver outros organismos que são "cultivados" no laboratório para estudos de ecotoxicologia: Daphnia (pulgas de água), Odonatos (libelinhas), Lemna minor (lentilhas de água) e outros. No final do dia, o Dr. Pestana ajudou a Laura e a professora a recolher cerca de 2 centenas de adultos de Dugesia tigrina para trazermos connosco e dar início à nossa colónia de planárias.
Figura 2. Planárias na estrada: colheita de exemplares e viagem Aveiro - Oeiras. O Dr João Pestana, a Laura e a professora Maria dos Anjos Tomaz recolheram casulos e adultos da planária Girardia tigrina que trouxemos connosco com muito cuidado, em tubos Falcon, na viagem de carro até Oeiras. No laboratório em Aveiro, para além de planárias, estudam-se outros organismos utéis em estudos de ecotoxicologia como Daphnia, lentilhas de água e libelinhas (nas imagens). Como destaques da viagem ficam ainda a deliciosa focaccia que a professora Tomaz trouxe para o nosso "lanche" e a simpatia do Sr Milton, que conduziu o carro, e que não escapou a uma "aula" sobre platelmintas e outros invertebrados bentónicos e conversas várias sobre literacia em ciência e em saúde! Um obrigado muito especial à Câmara Municipal de Oeiras (CMO), muito particularmente à Elisabete Brigadeiro e à Maria José Amândio do Gabinete de Ciência e Inovação, por terem organizado o transporte.
E assim... o Projeto Planária descolou.
Neste momento, temos já um laboratório de planárias estabelecido no CBR, onde estamos a cultivar e a propagar os animais! Em breve, a Laura poderá vir buscar parte da colónia e levá-la para a escola Quinta do Marquês, onde poderá manter os organismos e fazer com eles as experiências para o seu projeto sobre as alterações climáticas. Porque os laboratórios do CBR têm a possibilidade de manter as condições ambientais bem controladas, o Lit Up irá manter parte da colónia aqui, para o caso da colónia se dar menos bem na escola.
Figura 3. O novíssimo Laboratório de Planárias do CBR. Nós estamos abertos e prontos para o negócio! Isto é, o negócio de manutenção e teste de organismos Girardia tigrina para qualquer projeto em que professores e alunos de Oeiras possam estar interessados. As nossas planárias recentemente instaladas receberam os primeiros visitantes: Laura, o seu colega Miguel e a professora Maria Tomaz vieram saber como estão os seus preciosos objetos de estudo.
(Texto por Joana Loureiro; fotografias por Joana Loureiro e Maria dos Anjos Tomaz)